Ganhei de presente do meu Pai uma caneta. Diferente das
canetas esferográficas com as pontas mordidas que tenho em meu estojo, essa é
daquelas canetas bonitas, pesadas, com uma ponta roller ball que deixa a escrita
com um aspecto sofisticado. Admirei-a, rabisquei um pouco e logo concluí que
era especial demais, portanto deveria ser usada somente para escrever coisas
importantes, que sua tinta só deveria ser gasta para produzir belas frases e,
por isso, ficaria guardada esperando uma ocasião digna.
Se essa
história fosse um desenho animado, tenho certeza de que, sabendo disso, a
caneta apareceria chorando em sua caixa forrada, sentindo inveja das BIC´s
mordidas que anotam lembretes no dorso das minhas mãos, mas, felizmente,
visualizando isso, peguei-a para escrever este texto sobre “os desejos de uma
caneta”. A felicidade dela não precisa esperar um belo texto; ela pode estar em
um jogo-da-velha feito na última página de um caderno, porque tudo que quer é
ser usada, pois foi para isso que veio ao mundo.
Minha mente cria analogias quase que instantaneamente
e me pôs a pensar nas muitas pessoas que mantêm o costume de se “guardar”; que
não são capazes de se doar porque acreditam que precisam poupar seu potencial
para situações mais importantes. Deixam para depois o esforço, a felicidade
porque têm plena certeza de que se esgotam se usados em excesso.
A felicidade
e satisfação estão em abrir a alma para todo e qualquer trabalho a ser feito,
pois, diferente de uma caneta, nosso tempo de existência não diminui de acordo
com o que produzimos, mas, assim como ela, a tinta pode secar sem que tenha
chegado ao fim.
Não estou
falando de aproveitar a vida, estou falando de outro clichê que julgo ainda
mais importante: gastar (totalmente diferente de desperdiçar) a vida a todo o
momento; descarregar todo o potencial e energia em absolutamente tudo, de
acordo com as condições possíveis em cada ocasião, pois, diferente de uma
caneta, temos o poder de comandar a própria existência, logo, se estamos
insatisfeitos com ela, a culpa é nossa.
Nem tudo
depende de mim, é verdade, mas, podendo sair da caixa e escrever, não
há razão para invejar os que estão escrevendo.
Letícia Gedrat
Letícia Gedrat
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